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Culinária do Pará: símbolo de exotismo e paixões da Região Norte

28 mar 2015 - 10h18
(atualizado às 10h18)
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Exótica para muitos e amada pelos moradores locais, a culinária do estado do Pará encanta pelos sabores, aromas, cores e texturas, com forte influência da tradição dos índios nativos da Amazônia, misturada em menor medida com produtos e tradições que brancos e escravos trouxeram ao chegar à região.

Ninguém que prova o pato ao tucupi, o tacacá, a maniçoba, a farinha d'água, sai imune de experimentar uma explosão de sentidos, que aguça e leva o paladar aos limites do prazer, como a sensação anestésica causada na boca pelo onipresente jambu, erva que condimenta e colore de verde muitos dos pratos, nos quais também marcam presença a pimenta de cheiro, a chicória, o coentro, entre outras ervas.

Em mais uma etapa da Expedição Fartura Gastronomia - que faz um mapeamento de produtos e culinária de todos os estados do país -, a equipe do projeto pôde ver de perto as maravilhas e os "desafios" das iguarias locais.

"Nosso objetivo é mostrar o potencial que o Brasil tem para o turismo gastronômico e também quando possível levar essa culinária local para os eventos organizados após o fim do trabalho da Expedição", explicou Rusty Marcellini, curador do projeto Fartura e do Festival de Cultura e Gastronomia Tiradentes, e chefe da equipe.

A Agência Efe acompanhou parte desta etapa, que, saindo da capital Belém, visitou uma região famosa por sua beleza natural e tamanho: a ilha de Marajó.

O primeiro objetivo foi a coleta de uma iguaria apreciada pelos indígenas, imitada pelos que trabalham no mangue e que assusta quem é de fora da região e até mesmo alguns moradores: o turu (Teredo navalis).

Trata-se de um molusco parecido com uma minhoca e que se instala nos troncos podres do mangueiro, árvore abundante nos manguezais da região. Ele pode chegar a medir dois metros. Os coletores de turu buscam o tronco estendido sobre os lamaçais, cortam-no e expõem o animal, que morre na hora. Em seguida, fazem sua limpeza - que consiste na retirada das vísceras e cabeça, e lavam-no nas próprias águas dos igarapés formados com a baixa da maré no mangue.

Para assombro dos "forasteiros", ele é ingerido ali mesmo, marinado em um caldo de sal, pimenta e limão. Dizem que o alimento é afrodisíaco e que dá força física para os seus coletores, que vão para o mangue na busca de caranguejos e acabam se alimentando do turu.

A próxima parada na ilha de Marajó foi para conhecer um dos símbolos do local: o búfalo. A Expedição visitou a fazenda Mironga, no município de Soure, onde são criadas 42 fêmeas do animal para a produção de queijo, manteiga e doce de leite.

O queijo produzido no local tem características próprias. "Ele tem massa fundida, é mais parecido com um requeijão. A coagulação do leite é feita de forma espontânea, sem coalho", explicou Guto Gouvêa, filho do proprietário da fazenda e responsável pela produção.

Além do queijo, a carne do animal também é bastante apreciada pelos habitantes locais, e há pouco tempo começou a ser produzida em escala maior, com mais qualidade e sabor, pois deixou de ser utilizado o búfalo selvagem, de consistência dura, e começaram a ser criados e abatidos animais com no máximo 24 meses de vida, que têm carne mais macia.

O prato mais comum na região é o filé marajoara, com queijo de búfalo por cima, de consistência macia e muito saboroso, acompanhado de arroz, farofa e legumes.

De volta a Belém, no tradicional Mercado Ver-o-Peso, a equipe foi acompanhada pela chef paraense Ilca Carmo, que sempre compra seus produtos lá e onde apresentou as maravilhas locais, com destaque para as frutas. Algumas já são conhecidas em outras regiões do país, como cupuaçu e castanha do Pará, mas também há as pouco conhecidas bacuri, taperebá, uxi e sapoti.

"No Ver-o-Peso encontramos todos os produtos que caracterizam a cozinha local: o tucupi, o filhote, peixe muito apreciado por aqui, as frutas como o bacuri, o cupuaçu, que são apresentados em todos os lugares na forma de sucos, compotas, bem como o jambu", explicou Ilca.

Mas a estrela local é com certeza o açaí. Este coquinho de cor roxa é um "vício" gastronômico dos moradores locais e acompanha praticamente todas as refeições. Na ilha do Combu, próxima a Belém, a Expedição acompanhou a coleta e transporte do fruto, e logo em seguida de volta à capital, seu processamento e degustação no restaurante Point do Açaí, de propriedade do roraimense Nazareno Alves.

Se as barracas de açaí colorem de roxo o Ver-o-Peso, o amarelo do tucupi predomina nas quais é vendido. O tucupi nada mais é do que o sumo extraído da raiz da mandioca brava para separar a goma (amido) do líquido. Este líquido é fervido e fica fermentando de três a cinco dias, quando se acrescenta a ele, geralmente, alho, pimenta, sal e condimentos.

Com ele se prepara muitos pratos nos estados da Região Norte, como o pato ao tucupi, o tacacá (com jambu e camarão seco), a caldeirada paraense (com peixes e legumes), entre outros.

A maniçoba é outro exemplo da cozinha local, mas nesse prato o tucupi fica de fora. De influência portuguesa, é também conhecida como "feijoada paraense", pois utiliza carne de porco misturada à folha moída da mandioca brava, um ingrediente bem local. O processo de preparação da massa da folha leva uma semana. O aspecto visual do prato é pouco atrativo, mas o sabor, inigualável.

A Expedição Fartura Gastronomia percorreu nos três últimos anos 17 estados e quase 50 mil quilômetros. Em três anos de pesquisa, passou por 120 cidades e entrevistou aproximadamente 300 personagens da gastronomia brasileira. Em 2005, Goiás, Tocantins e Pará foram os primeiros a serem visitados. Em maio, Piauí e Maranhão entram no circuito.

Assim como nos outros anos, a conclusão do trajeto dará origem a um livro e a um documentário com relatos de todos os produtores visitados, além das receitas executadas pelos chefs que acompanharam as etapas utilizando os ingredientes de cada local. Em 2014, o livro Expedição Brasil Gastronômico venceu o prêmio Jabuti na categoria Gastronomia.

EFE   
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