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Vidente relata passeio em que a vida toda é revisitada

16 fev 2016 - 11h35
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Foto: iStock

Abriu os olhos. A lua cheia, alta no céu, iluminado tudo como um sol azulado, mais discreto e misterioso. 

Levantou-se. Estava numa pequena jangada, agarrou o mastro. O tecido fino da vela, quase diáfano, dançava – flap, flap, flap – num vai-e-vem soprado pelo vento leve.  

Lentamente afastava-se da margem. Tudo estava imensamente calmo, silencioso. Nenhuma vibração. O fundo do barco parecia pairar um palmo acima da superfície da água, polida como cristal. 

Olhando para a popa, reconheceu lado a lado, abraçados, os três rostos que mais amava: a mulher, o filho, a filha. Cada vez mais distantes, acenavam vagarosamente, três mãos direitas subindo e descendo em câmera lenta. Ficaram menores, fundiram-se num único ponto, perderam o contorno, acabaram diluídos.  

Voltou-se para a proa e, surpreso, atravessou, como se fossem telas de cinema feitas de nuvem, importantes momentos de sua vida.  

A mãe abraçando e cantando enquanto amamentava. Apertando o mastro percebeu um sabor intenso de vida em plenitude invadindo-o. 

Um pouco adiante o pai, ainda de gravata presa ao pescoço, sapato social chutando a bola para que ele, franzino nos seus sete anos, devolvesse. Uma sensação de alegria se apresentou com toda força. 

Na sequência o reboliço de amigos, o recreio animado, todos correndo e brincando no pátio da escola. Aquela energia o animou. 

Depois o bailinho juvenil em torno da vitrola (“brincadeira dançante”, como se dizia na época). Música, timidez, paquera, entrelaçar de mãos, primeiro beijo. Coração pulando ao reviver tantas expressões do amor.  

Logo a seguir, quadro a quadro, em sucessão, os estudos, as grandes paixões, a mulher da sua vida, o casamento, filhos, trabalhos, esforços, dificuldades, conquistas. Um redemoinho de tantas coisas.  

A vida sendo cruzada de novo, rapidamente, no encadeamento dos momentos decisivos. Que mistura de experiências, quase oitenta anos delas: força, gratidão, felicidade. 

Estava embebido de tudo isso quando, madrugada indo pela metade, percebeu que sonhava. A jangada era o leito e a vela o lençol muito branco com o nome do hospital estampado em azul marinho profundo. 

Abriu os olhos. A lua cheia, alta no céu, iluminado tudo como um sol azulado, mais discreto e misterioso...

Quer saber mais sobre o trabalho de Marina Gold ou entrar em contato com ela, clique aqui.

Fonte: Especial para Terra
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